quarta-feira, 6 de julho de 2016

A grandeza de João


Entre todos os apóstolos do Cristo, João foi o único que não sucumbiu, na vida física, diante das dores do martírio. Sem a beleza da jovialidade que lhe caracterizava nas primeiras horas do Cristianismo sobre a terra, o discípulo transformou-se num ancião venerável portador de indelével beleza dos sentimentos.

Ao seguir a recomendação do Mestre bem-aventurado aos pés da cruz, o poeta - dono do mais espiritual de todos os evangelhos – uniu-se, parasempre, ao coração magnânimo e amoroso de Maria a fim de iniciar, no divino silêncio de Deus, o fundamental trabalho de divulgação da Boa Nova na Igreja de Éfeso, na Grécia. De estrutura modesta, o pequeno templo não se destacava pelas pompas exteriores, mas pela grandeza de duas almas que se converteram em fiéis servidoras da vontade celeste: tomando a própria cruz pelos braços e diminuindo-se, em atitude humilde, para que a Luz do Mundo, em seus espíritos, pudesse crescer. Santas consolações foram espalhadas. Corações alquebrados pelas amarguras vividas reacenderam de esperança ao sentirem, na intimidade, os clarões de um novo reino que nasce dentro de cada um.

Após o serviço incansável, conta a tradição oral dos mensageiros e peregrinos do amor que João, uma vez aprisionado na ilha grega de Patmos, repetia em suas singelas preleções: "queridos, amai-vos!". Certa vez, incomodados com a obstinação serena do discípulo bem-amado, os carcereiros da masmorra o perguntaram:

– Você não cansa de repetir sempre as mesmas palavras?
João, que já trazia nos olhos "a candeia viva", contemplou a paisagem soberana do Mediterrâneo e, fazendo brilhar a sua luz, respondeu mansamente:

– Quando vocês tiverem aprendido esta lição, eu passo para a próxima.

E disseram os testemunhos que o acompanharam nos instantes derradeiros daquela sua passagem pelo orbe terreno: o apóstolo despediu-se dizendo – "meus filhinhos, amai-vos uns aos outros!"

Em silêncio...

Quando olhamos para o céu e nos deparamos com a beleza do firmamento enfeitado, simultaneamente, por estrelas rutilantes e pelo brilho da lua inflamada de luz, por acaso, vemos, abaixo da obra, alguma assinatura em que se possa ler "Deus"?
O Amor Infinito sempre se oculta. Age em silêncio. E, com Seu poder absoluto, equilibra os mundos erguidos na imensidão. A lição da humildade está, acima de tudo, presente na Criação divina.

Nos detalhes...

Certa vez, o inesquecível líder indiano, Mahatma Gandhi, disse que se todas as obras literárias da Humanidade se perdessem e sobrasse, apenas, o Sermão da Montanha não se teria perdido nada. Sob o influxo do verbo misericordioso de Jesus, os evangelistas anotaram um roteiro para redenção dos homens.
Numa dessas passagens, o Divino cordeiro disse que “os olhos são a candeia do corpo, e se os nossos olhos forem bons, todo o nosso corpo será luminoso”. É bem provável que, neste momento, você esteja sendo amado incondicionalmente aqui e também do lado de lá da vida. Sem perceber ou ter notícias desses corações devotados, você sofre. E o problema não está fora, mas dentro. Deus espera, tão-somente, que o fogo que arde em nosso peito diminua para que um facho de luz possa muita coisa reformar.
Tenho certeza que você jamais errou nesta vida por ser generoso, solidário, gentil, pacífico e amoroso. Nós temos naufragado mil vezes nas ondas do egoísmo e do orgulho, quando a vida, incessantemente, nos faz convites de simplicidade.
Eu nunca vi ninguém num leito de hospital, próximo à morte física, pedir que lhe trouxessem seu extrato bancário, a escritura do imóvel, os títulos acadêmicos ou documento do carro. Geralmente, mais ou menos lúcido, em vista da despedida, o Espírito roga para ver alguém que não perdoou, pede para beijar os filhos, ver o sorriso dos netos e diz ao companheiro devotado – “eu te amo, obrigado por tudo”.
Transformar-se é tarefa para corações que admiram os detalhes da vida. Não à toa, após a crucificação, Jesus – que havia operado maravilhas de cura, na terra, – foi reconhecido pelos seus apóstolos pela maneira como repartia o pão. Ao ver aquela figura, aparentemente desconhecida cortando o alimento, os discípulos exclamaram, cheios de felicidade: “Rabi!”.

Então, fica a pergunta: que detalhes da vida nós já somos capazes de ver com os olhos da alma?

Sonhar...

Os sonhos, no mundo, têm a natureza da flor: são frágeis, mas tem a seu favor a beleza e o perfume. E é por isso que vale a pena vivê-los. 

Talvez, você tenha planejado estar aqui hoje. E é o máximo que poderia fazer, porque não temos o controle de todas as circunstâncias da vida. Um simples engarrafamento poderia lhe fazer chegar atrasado ou um convite do mundo espiritual impossibilitaria que você viesse ao André Luiz encarnado. Há, sem dúvidas, as obras humanas, todavia acima delas reina a vontade Soberana do Criador. E o que Ele deseja? Dizem as sagradas escrituras de todos os povos que a vontade do Pai é que cada filho reflita aquilo que tem de mais profundo: a imago Dei – a imagem de Deus. 

E ninguém consegue isso sem passar por uma imensa transformação: que vai das lições mais simples do aprendizado até os testemunhos de grandeza espiritual. 

Fica uma pergunta: o que temos feito da nossa vida e dos planos de Deus a nosso respeito?

Com essa indagação, gostaria de parafrasear o grande líder norte-americano, Martin Luther King, e dizer que eu também “tenho um sonho”, aliás, um grande sonho que começa na mudança pessoal até atingir toda Humanidade: 

Sonho com o dia em que as pessoas reservarão, de verdade, espaço em suas vidas para viver o amor.

Sonho com o instante, em que observando o grande Servidor que é Deus, os homens não mais dirão que não têm tempo para as realidades espirituais.

Sonho com o momento em que hospitais e cemitérios não serão mais os ambientes em que os corações, em atitude derradeira, se atreverão a dizer “eu te amo”.

Sonho com o dia em que toda consciência no menor gesto de violência contra o próximo ouvirá, em si, a voz do Cristo a lhe perguntar: “ por que tu, me persegues?”. 

Sonho com a data em que as pessoas, vencendo a frieza do cotidiano, encontrarão mil formas de se abraçarem e olharem uma nos olhos das outras. 

Sonho com o dia em que alguém vai esquecer a hora e passar uma tarde comendo o que gosta e rindo com seus amigos. 

Sonho com o dia em que ninguém irá dormir sem a alegria de um beijo no rosto. 

Sonho com o momento em que o amor será tão livre que nenhum homem deixará de vivê-lo por medo ou preconceitos de cor, sexo, classe social e idade. 

Sonho com o instante em que as pessoas compreenderão que coração que muito ama não divide, mas multiplica.

Sonho com a data em os homens se darão conta que as flores têm aromas especiais, que os pássaros cantam, que a chuva refresca, que o sol ilumina, que a natureza é uma grande tela é que, por trás do pincel da criação, há um pintor Divino. 

E todos esses sonhos não estão sendo contados para máquinas de pagar contas, somar e subtrair dinheiro, mas para almas que têm como destinação um Reino de claridade, amor, perdão e justiça. E esse Reino nasce dentro de cada um. 

A travessia da vida


     Duas palavras são muito utilizadas no vocabulário espírita: livre-arbítrio e autocura. Será, porém, que o simples fato de repeti-las a cada discurso faz com que possamos apreender o significado de ambas? Creio que, talvez, a nossa interpretação – até agora limitada – tenha nos conduzido, muitas vezes, aos labirintos do egoísmo e da solidão.
     Em Seu Ministério Divino, Jesus reuniu 12 apóstolos para assinalar que os homens não podem realizar nada sozinhos. Ninguém aguenta, por muito tempo, carregar a própria cruz se, no caminho, não encontrar uma mão amiga que lhe alivie as dores. Só compreende o “fardo leve” e o “jugo suave” do Cristo quem aprendeu a compartilhar na trajetória da vida. Aceitar ajuda do outro é reconhecer que o livre-arbítrio não é atestado de autossuficiência. Liberdade não representa seguir na solidão. Ninguém se basta, apenas o Criador é absoluto e, mesmo assim, nos chamou à vida para nos entregar o Seu Amor.
    As dores da Humanidade são a soma da porção de sofrimento de todos nós, e a cura, como não poderia deixar de ser, passa pelo encontro das virtudes de cada alma. A preocupação, apenas consigo, faz com que, na corrente da vida, falte um lenço para enxugar lágrimas. E essas lágrimas podem ser as suas... Temos muitos talentos, mas na Terra, infinitas são as nossas necessidades...
    Um advogado não precisa se tornar odontologista para tratar uma dor de dente. O bom-senso e a Lei de Solidariedade o aconselham a procurar um dentista. Já pensou se todo mundo soubesse fazer tudo? Quanta tristeza seria! Um planeta sem amigos e amores. Uma vida sem trocas, sem caridade, sem alma...
    As relações andam doentes. É fato. As experiências pessoais e coletivas apontam para uma descrença no homem. O outro tem sido visto como fator de risco. Por isso, poucos se aprofundam em seus relacionamentos. O artificialismo dos encontros e da convivência diária gera um enorme vazio emocional, pois aumenta a distância entre os corações.
   É chegado o tempo de percebermos que o nosso semelhante não se resume ao punhal que corta e o espinho que dilacera. A partir da mudança de olhar, ele pode ser o beijo de ternura, o abraço que acalenta, o carinho que consola, o sorriso que ilumina, a poesia que emociona e a partitura que retira melodias da nossa alma.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

As três revelações divinas


O homem comete muitos erros por julgar temas amplos, valendo-se, tão-somente, do superficial. O adepto, verdadeiramente, convertido ao Cristianismo, não pode ignorar o trabalho hercúleo de Moisés no seio do judaísmo. Citar a Lei de Talião[1], como se ela resumisse o espírito do trabalho mosaico, é um grande equívoco histórico e, sobretudo, espiritual. A revelação, obtida nas rochas do Sinai, foi inaugurada pelos artigos pétreos do amor. Se a população hebraica ignorou o chamado divino e preferiu se vestir de parafernálias teológicas, o enviado de Capela[2] não deve ser responsabilizado, porque os dois primeiros mandamentos celestes já estavam à disposição dos corações humanos. Prova marcante dessa essência encontrasse, até hoje, nas odes inspiradas dos profetas do Velho Testamento. "Um pequenino se acha nascido para nós, e um filho foi dado a nós, e o nome que se apelidará será Deus Forte, Pai do futuro século, Príncipe da Paz. O seu império se estenderá cada vez mais e não terá fim" (Isaías, 9:5,6).  Apesar da resistência tribal e guerrilheira que mantinha a idéia insana de um Deus vingativo e exclusivista, o esforço das hostes sublimares foi recompensado; uma vez que nascia na paisagem, deste orbe, o sentimento monoteísta.
A base da religião estava sedimentada no decálogo[3]. Faltava, pois, um Farol Singular, que pudesse iluminar a antiga tábua da lei e exortar o povo a compreensão dos escritos em sua pureza genuína. Séculos depois de Moisés, a chegada de um Rei (jamais visto) modificava a atmosfera da Terra. No livro Boa-Nova, o amigo espiritual, Humberto de Campos, conta-nos que, à época, “o grande império do mundo, como que influenciado por um conjunto de forças estranhas, descansava numa onda de harmonias e júbilos, depois de guerras seculares”. Antes mesmo de nascer, o Menino-Luz, anunciado nas profecias, higienizava a aura do planeta com a Sua notável aproximação.
Trinta anos se passaram desde que o brilho da estrela-guia norteou a caminhada dos Reis Magos ao encontro do Messias, segundo a tradição bíblica. Era chegado o momento. Jesus começava a divulgação da mensagem eivada de beleza espiritual.  Antes daquela hora suprema para o futuro da Humanidade, muitos filósofos, em civilizações milenares, escreveram, falaram e praticaram o amor, mas somente o Doce Rabi da Galileia viveu tudo o que diz respeito a essa emoção divinal. Através dEle, os aflitos ouviram o Sermão da Montanha, viram gestos de profunda compaixão e presenciaram a prova da renúncia máxima no holocausto da cruz. Quem fizera tanto por uma gente pobre e simples em tão pouco tempo? Absolutamente ninguém. O Evangelho[4] já estava entre nós...
[5]O Cristo ensinou a todos nós o valor de se combater o pecado, mas amar, sem limites, o pecador; deixou claro que não há sentido em mergulhar no amor de Deus, se as criaturas não canalizá-lo para o seu semelhante; retirou das mãos homicidas a faca dos sacrifícios, pois a partir do instante em que o sangue do Cordeiro Divino foi espargido no calvário, não eram mais precisos os rituais bárbaros para se chegar ao Sagrado; provou que o verdadeiro pastor tem cheiro de ovelha e recusa-se a ficar, isolado, em cima de um púlpito, assoviando lições não vividas e mostrou que quem não ama só enxerga defeitos, porque se limita ao presente; enquanto, a alma que ama vê qualidades e enxerga potenciais, haja vista que acredita na capacidade imanente do ser humano de evoluir. Dentre infindáveis lições, o Mestre também mudou a relação do religioso com as liturgias templárias, ao dizer: “entra no teu aposento e, fechada a porta, orarás a teu Pai que está em secreto” (Mateus, 6:6).
Jesus deu prova viva do não-fundamentalismo. Embora, enorme conhecedor das leis judaicas, Ele não aceitou o argumento dos sacerdotes. Utilizou-se, no fundo, das codificações clericais para escapar das perguntas capciosas que almejavam derrubá-Lo. Ao passo que o totalitarismo tentava abraçar, como se fosse possível, as coisas de Deus, o Cristo visitava lugares, onde o poder instituído não queria estar: ao lado de paralíticos, cegos, surdos, mendigos, prostitutas, adúlteras... O que Lhe motivou a consolar os supostos amaldiçoados, segundo o olhar daqueles que amam o privilégio? Narcisismo, ego, aplausos. Não, nada disso. Numa síntese: caridade, o amor em ação. 
O Mestre, que conhecia a intimidade do plasma das estrelas, comprimiu – em gesto humilde – a Sua Luz esplendorosa a fim de não nos ofuscar e se utilizou dos recursos possíveis da cultura e da natureza, ambas peculiares a Galiléia, para se fazer entender naquelas simples parábolas. Mas, não nos enganemos: “as palavras dEle eram sopro espiritual ao encontro de narinas de barro”(Haroldo Dutra Dias). Por isso, muitos ainda não o compreendem, e a Besta do apocalipse retarda a aurora de um novo domingo pascal no cenário do Terceiro Milênio.
 Sob a anuência imperialista de Roma, a Igreja Católica se intitulou como interprete única dos textos bíblicos ao se valer da Segunda epístola de Simão Pedro. O pescador de Cafarnaum anotou “que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação, porque nunca, jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana, entretanto homens falaram da parte de Deus movidos pelo Espírito Santo” (Pedro, 1:20,21). À luz da fé raciocinada, essa imposição autoritarista se desconstrói. O grande mártir do Cristianismo convocou o trabalho coletivo quando escreveu “que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação”.
Em 1870, o Concílio Vaticano 1º decretou a infalibilidade do Papa. Reza a carta dogmática que o líder do Clero não erra em “decisões definitivas no campo da fé e da ética”, além de ser o sucessor de Pedro e o líder entre todos os apóstolos de Jesus. Os homens que se opusessem a determinação, dentro da igreja, seriam excomungados. Se lesse, mais atentamente, a primeira epístola de João, talvez, o Sumo Pontífice recuasse em sua intenção, tal a clareza do argumento: “Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós” (João, 1:8); mais à frente, o discípulo, bem-amado, dá outra lição exemplar: “Ninguém jamais viu a Deus; se amarmos uns aos outros, Deus permanece em nós, e o seu amor é, em nós, aperfeiçoado” (João, 4:12). Por que, pois, tanta encenação cerimonial e luxo se o convite à participação, no concerto divino, está condicionado ao amor?
A respeito da miopia que, apenas, enxerga os tesouros de César, o apóstolo Tiago comenta: “porque o sol se levanta com seu ardente calor, e a erva seca e a sua flor caem e desaparece a formosura do seu aspecto; assim também se murchará o rico em seus caminhos”[6] (Tiago, 1:11). Na mesma carta, ainda pode-se ler: “A religião pura e sem mácula, para com Deus e Pai, é esta – visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo” (Tiago, 1:27). Nessas expressões de elevado cunho moral, os cristãos ouvem um apelo em direção à caridade, à vida simples e à reforma íntima, como práticas superiores aos atos externos.
Os catedráticos rechaçaram uma experiência puramente espiritual. Amantes das insígnias sacerdotais, eles arrumaram formas de conciliar a água santa do Evangelho com as impurezas do mundo, cujo Mestre afirmou ter vencido. No entanto, o regato cristalino, se colocado em contato com o lodo, irá ser contaminado; e ao observar as correntezas, ninguém se lembrará de que a sua nascente é pura. Transcorridos 2015 anos, ainda permanecemos presos aos grilhões teológicos com a mesma dúvida da mulher samaritana – Onde adorar a Deus? E com a maior boa vontade, Jesus permanece repetindo: “Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade” (João, 4:24).
Foram longos os períodos em que o artificial triunfou sobre a essência, contudo os desígnios do Criador não podem ser encastelados em calabouços monásticos. Graças a Providência, o Consolador Prometido veio a estas plagas terrenas para pedir: “escutai-me. O Espiritismo, como antigamente minha palavra, deve lembrar aos incrédulos que acima deles reina a verdade imutável: o Deus bom, o Deus grande que faz germinar a planta e elevar as ondas. Revelei a Doutrina divina e, como um ceifeiro, reuni em feixes o bem esparso na Humanidade e disse: Vinde a mim, todos vós que sofreis!”(O Evangelho Segundo o Espiritismo)
 Enfim, o Espírito de Verdade que o mundo não podia receber estava entre nós. Em 1857, Allan Kardec divulga a primeira edição de O Livro dos Espíritos e submete ao crivo inteligente das massas à mensagem dos Imortais. Nesse período, o genial codificador orientava-se pela voz do espírito São Luiz, que o acompanhou, de perto, na jornada de elaboração do pentateuco espírita. O nobre mentor confirmou “que os espíritos não vinham, pois destruir a religião, como alguns a pretendem, mas, ao contrário, (...) vieram sancioná-la por provas irrecusáveis”, através de expressões “sem alegoria para dar às coisas um sentido claro e preciso, que não possa estar sujeito a nenhuma interpretação falsa”. (Questão 1010 de O Livro dos Espíritos)
O Espiritismo transformou o paradigma de religião. Muitos cientistas e intelectuais têm urticária quando ouvem falar sobre esse termo. O atavismo histórico do espírito reencarnante o remete a eras medievais; e, num século como o atual, de conhecimentos atômicos e cosmonáuticos, as idéias arcaicas causam enorme repulsa. O ser pensante vê, nelas, uma ameaça a sua sabedoria tão arduamente conquistada. Com a Doutrina dos Espíritos, tudo muda. A visão se expande, rompe as fronteiras obscurantistas do dogmatismo e percebe, maravilhada, um Deus das galáxias.
A iluminada doutrina esclarece ainda o fenômeno das vidas sucessivas. No livro A Gênese, Kardec afirma que “com a reencarnação, desaparecem os preconceitos de raças e de castas, pois o mesmo espírito pode tornar a nascer rico ou pobre, capitalista ou proletariado, chefe ou subordinado, livre ou escravo, homem ou mulher”. Posta a candeia sobre o velador, a idéia de superioridade de povos e raças desaba perante a Justiça Soberana.
 Obviamente, a Terceira Revelação torna o caminho dos homens mais difícil ao classificar o bem como uma prática diária e de difícil execução, conforme já nos alertara Jesus ao falar que “estreita é a porta e apertado o caminho que conduz para vida, e são poucos os que acertam com ela”. Daí, não causa espanto que a França, o berço de Kardec, e o restante da Europa, o velho continente, tenham ignorado o som da trombeta e o coro dos anjos. Crêem eles, até hoje, que Jesus veio curar os males do corpo, e não, os paralíticos da alma, que desembarcam no plano espiritual inertes devido à densidade de seus perispíritos (Nosso Lar, André Luiz). Mas, a vaidade humana não é capaz de abafar os Espíritos do Senhor. João Evangelista, Santo Agostinho, São Vicente de Paulo, Sócrates, Platão, Fénelon, Paulo de Tarso e inúmeros outros não vieram, de tão longe, à toa. Se os europeus dormem, a exemplo dos apóstolos no Jardim das Oliveiras, o Espiritismo deveria migrar para o solo em que encontraria condições de proliferação. Impossível, aqui, ignorar o médium Francisco Cândido Xavier e os benfeitores que o auxiliaram. As obras básicas deram corpo espiritual à doutrina e os mais de 400 livros psicografados, por Chico, ampliaram a aura dos ensinamentos, tornando maior o seu alcance.
Através do médium, o espírito Emmanuel convocou os corações, atentos, ao pacto de amor do Evangelho primevo e costurou, em inspirada literatura, as diferenças entre “atividade religiosa” e “serviço divino”. Na obra, Agenda Cristã, outro benfeitor, André Luiz, alertou as mãos, ávidas por benesses, sobre a necessidade de se afastarem dos holofotes da fé publicitária e vazia, ao dizer que “perdendo venceremos a batalha humana, cedendo obteremos os recursos de que precisamos, libertando conquistaremos os outros, suportando resistiremos na tempestade, sofrendo teremos mais luz (...)”.
Uma conquista formidável, que merece destaque:
 O Jesus que a Doutrina Espírita nos apresenta é um Jesus que está, a anos-luz de distância, do Jesus que a Humanidade conhece. (Haroldo Dutra Dias).
O mundo lê os evangelhos, e o que vê? Um galileu, vestido em túnica branca, filho de um carpinteiro com uma dona de casa. Então, vem o Espiritismo e repete a pergunta: “O que você vê?”. E o adepto estudioso responde: “vejo, simultaneamente, o Artesão Divino, o Artista Sideral, o Sublime Peregrino, o Psicoterapeuta de Todos os Tempos, em resumo, o Governador Espiritual do Planeta Terra”.




[1] “Olho por olho; dente por dente”.
[2] Constelação de onde vieram diversos espíritos, que reencarnaram na Terra primitiva a convite de Jesus. Naquele período, a maioria dos habitantes de Capela já vivia em clima de profunda fraternidade. As almas que vieram para o orbe terrestre perturbavam a harmonia do ambiente. Mesmo intelectualmente avançadas, elas apresentavam considerável retardo moral. Desse fato, resulta a Teoria dos Anjos Decaídos presente na Bíblia. Porém, graças a Misericórdia do Pai, muitos daqueles irmãos cumpriram a tarefa de auxiliar o progresso da Terra e, quites com a Lei de Causa e Efeito, ganharam a permissão de voltar para um mundo mais feliz.
[3]  A Primeira Revelação
[4] A Segunda Revelação.
[5] As idéias do parágrafo foram organizadas a partir de uma palestra de Haroldo Dutra Dias – expositor espírita, que, em recente trabalho, traduziu os Evangelhos do grego para a Língua Portuguesa.
[6]  Não há problema algum com a riqueza material, desde que ela tenha origem honesta e seja empregada como recurso divino.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Em busca do Sol...

“Assim, ele dizia: A que é semelhante o Reino de Deus, e a que o assemelharei? É semelhante a um grão de mostarda...”. (Lucas 13:18-19)

A semente traz, em si, o projeto magnânimo de uma árvore. Com o seu DNA divino – que no porvir lhe conduzirá à belas florações – o minúsculo grão encara o escuro e solitário seio da terra. A partir daí, dá-se a sua luta gloriosa para haurir nutrientes, muitas vezes escassos, a fim de enraizar, em definitivo, as bases da vida que almeja. Quando surgem os primeiros brotos, rompendo o solo bendito que lhe serviu de berço, a semente vislumbra o campo imenso a que se destina. É o início do seu êxtase. A metáfora da individualidade humana que vence as enormes intempéries da existência ao mergulhar no seu “eu profundo”, resgatando, nos recônditos do Espírito, a essência divina que, nela, foi depositada. A terra escura – como analogia ao ego, dínamo das nossas atuais emoções – é a cruz da semente. A tarefa à qual ela foi chamada a cumprir para, por méritos, ser banhada pela luz solar, símbolo do Evangelho, que, para os homens, assim como para todas as obras da criação, é o amor infinito e a sabedoria suprema de Deus.
Vencendo o egoísmo que faz a consciência viver, apenas, para alimentar os seus caprichos, o homem rompe “a casca do eu” e põe a Lei Divina no centro de suas expectativas e tal qual a árvore cresce, em linha vertical, rumo às paragens dos montes celestes. Nutrida pela seiva da caridade, a alma – na sua jornada evolutiva – passa a doar bem-aventuranças, em forma de frutos, sementes e sombra acolhedora, como testemunho da obra de Deus na sua intimidade. Surge, então, na Galileia das nossas vidas – colorida pelos mais belos jardins do sentimento, a exemplo da época de Jesus – a Boa Nova do Reino.