sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Oxum, a flor das águas doces


  Eu vi a beleza da gira quando se cantou para Oxum.

Aieiê ô, minha mãe. Os teus filhos te saúdam. Vem da linha das águas, trazer o teu axé encantador. Eu te reconheço na magia dos cantos e pela vibração de amor.

A sabedoria do caboclo
  Antes da despedida, um amoroso caboclo pediu aos médiuns que a falange de Oxum fosse saudada para comandar os trabalhos seguintes. Nas breves palavras, ele assim disse: - uma casa de Umbanda pode ser avaliada pela manifestação dos espíritos que trazem energias sutis e harmoniosas dos planos superiores. Tenham a certeza de que o amor é o sentimento supremo, e nessa freqüência Oxum vem saravá. Vejamos, então, meus queridos filhos, o que vocês têm trazido no coração e se são merecedores de tão formosa irradiação”.

  Em questão de segundos, o caboclo “girou”, e uma linda sabiá entrou no terreiro e pousou no Gongá. Nenhum médium atreveu-se a incomodá-la. Era a singela ave mais uma integrante da Banda. O canto divino, que vinha das matas anunciava a felicidade de Oxossi e a alegria do seu reino. A mensagem, porém, não estava completa. Faltava uma rosa, e ela veio – presa ao bico de um beija-flor. Era o prelúdio do caboclo. Quem viria? Não restavam mais dúvidas. O povo de santo já cantava para Oxum.

“Atrás daquela serra, tem uma gruta do lado de lá,
Tem um barquinho de ouro, Mamãe,
Aonde Oxum foi se assentar ”.

    Quando o Ogã firmou ponto, uma energia materna e doce envolveu os médiuns da corrente, como se jogasse a todos num sono de paz. Ninguém ficou em transe. Oxum, naquele instante, não viera para tomar a consciência de seus aparelhos. Parecia que a mãe de cada um estava ali, ninando-os no colo. Na assistência, uma criança chorou, outras pessoas fizeram o mesmo, imitando, em cena comovente e sincera, a pequena criatura. De dentro, alguém sinalizou com as mãos para que as pessoas pisassem no terreiro. Prontamente, foi atendido. Gentil e educado, o velho cambono organizava os consulentes para o passe, pois são eles a razão de uma casa aberta. As curas só acontecem se acolhermos os doentes que sofrem pelo mundo.

“Eu vi mamãe Oxum na cachoeira,
Sentada na beira do rio,
Colhendo lírio, liro ê,
Colhendo lírio, liro á,
Colhendo lírios pra enfeitar nosso Gongá”.

   O ponto mudou. E com sua melodia veio o chamado para a descida de Oxum. No balanço ritmado dos braços, o axé de amor era movimentado em benefício da saúde. Idosos, adultos e jovens viram-se envoltos pelo encanto do Orixá das águas doces. Da mesma forma que Maria embalou o Menino-Luz, Oxum fazia com as criaturas de Oxalá que inebriadas esqueciam os espinhos das agruras e semeavam a flor que nasceu nas margens d’água para ver no espelho cristalino o reflexo da sua imagem, feito uma fotografia natural.

  Fechada a gira, o caboclo de outrora retornou: “Feliz estou por todos vocês. É dura a luta que travamos contra os perigos da vaidade. Mas, graças ao bom Pai, vejo nesta casa uma evolução. Os meus filhos aprenderam a darem as mãos. Umbanda é plural. Nada se faz sozinho. Todos devem estar, sempre, preparados para doar com bom ânimo e receber humildemente. Não existe “ o meu preto-velho, o meu exu, o meu caboclo...”. O espírito não tem dono, e a mediunidade pertence a Deus e aos Orixás. Se hoje Oxum pôde penetrar o coração de todos, é porque as suas auras reconhecem melhor a Claridade. Sem brigas, ofensas e fofocas, há espaço para reencontros, consolações e verdade. Fiquem, filhos queridos, com o meu saravá. E não se esqueçam: a energia do bem é inconfundível”.



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