Ao
ver a mulher - que eu conheci sadia, visivelmente, magra e enferma, refletiu-se
em minha mente o retrato da dor que carrego. Há tempos, a dúvida me fazia
perguntar: por que tamanho sofrimento? Nenhuma resposta satisfatória surgia, e
as questões fervilhavam como as larvas de um vulcão incontrolável. Conheci, de
perto, a tristeza, visitei os infernos e de lá voltei. Graças aos céus, sem
amargura. Reconheço o que vi e, hoje, aceito as provas experimentadas.
Os
compromissos assumidos, na pátria espiritual, são sagrados. Ainda sou um aluno
primário, aliás, quase infantil, da minha realidade. Somente agora, despertei
para necessidade de me conhecer melhor. Desde a infância, sempre, procurei
caminhos no mundo exterior, e não os encontrei. Em virtude do fracasso,
desiludia-me feito um pássaro, que sabe o poderio do seu canto, todavia não
consegue entoá-lo. A felicidade, então, desenhava-se no subconsciente sem
nenhum traço de verdade; mera utopia dos esotéricos, místicos e filósofos.
Antes
da grande expiação, tive a passagem mais inesquecível da atual vida terrena.
Conheci, de perto, o Evangelho do Cristo. Amei Jesus como nunca pude amar
alguém. Durante esse reencontro admirável, entrei em estado de êxtase, senti-me
arrebatado pela claridade divina, que, cuidadosamente, lançava suas luzes sobre
mim, insuflando o meu espírito a zelar pelas frágeis plantinhas, nascidas na
soleira do quintal, à mercê dos pés ligeiros.
Recordei-me,
numa viagem impressionante, de sentimentos nobres. Parecia, naquele instante,
que eu havia mergulhado por 20 anos num sono, até então, irremediável. Somente
em relances de inspiração, fui capaz de me encontrar. Momentos raros e
passageiros, que - tão logo - faziam emergir o imenso abismo da minha
ignorância. Acompanhado pelo Amoroso Rabi, as paisagens ganharam formas
espetaculares; os frutos tornaram-se doces; as plantas, antes desbotadas,
reacenderam, no meu íntimo, a capacidade de enxergá-las como realmente são:
poli-cromáticas, cada qual mais bela que a outra. As orquídeas sorriram, as
azaléias também, e as rosas brancas choraram após o banho no fim da tarde.
Passei a dar importância aos detalhes; assumi, corajoso, o meu psiquismo contemplativo,
louvei a Deus no trautear dos canários e reverenciei o trabalho das abelhas em
suas colméias.
Lembro-me,
com saudades, daqueles dias, sem lágrimas de tristeza. Agora, choro de alegria!
Trago na alma cicatrizes que me socorreram nas temíveis atribulações. Ai de
mim, se não as tivesse colhido na lida espiritual. Cairia eu no primeiro
degrau, exausto buscaria forças, mas não teria de onde hauri-las. Nem de longe,
sou um grande médium. Tenho pouquíssima bagagem, não freqüentei confrarias
espiritualistas e também não lidei, pessoalmente, com grandes mestres. No
entanto, fui tocado pelas mensagens de Jesus de Nazaré. Uma simples faísca do Seu
amor, dividida em bilhões de átomos, foi suficiente para me abrir os olhos.
Enxerguei-o na cruz. Agradeci pela inolvidável Paixão, declamada nos versos,
mais lindos do Cosmo. Misericórdia em forma de parábolas. O júbilo escorria pelas
paredes do coração, elevando com a linfa preciosa do amor, a percepção
espiritual e, como quem anda por terras aprazíveis, tentei imaginar o que teria
visto Paulo de Tarso nas estradas rumo a Damasco.
Quando
chegou a hora das águas se agitarem, tive pouca fé. Agarrei-me ao manto que
reluziu no monte Tabor, para suportar as chicotadas das ondas. Quanta luta!
Duelei na escuridão. Esqueci, por desespero, os encantos de antanho. Graças a Deus, balancei, e não cai.
Aprendi que as angustias fazem parte da caminhada. A esperança nasce nas
trincheiras. Nos jardins, só colhemos flores, e a vida não se resume a elas.