As mudanças que o pobre
pretende ver no Brasil não virão da atual classe política. Embora sejam
assistidas pelos melhores médicos, nossas autoridades estão doentes. O ser
humano não tem a destinação de provocar horror ao próximo. Qualquer um que se proponha
a isso dá sinais de demência. As velhas oligarquias partidárias estão em
colapso ético. O destino delas é sucumbir. Tais estruturas são animadas por
células combalidas. As tradicionais lideranças já tiveram vez e voz neste País,
contudo olharam fixamente para as estruturas, esqueceram o fator humano e
ignoraram tudo aquilo que é gente. A verdadeira democracia jamais deixa de lado
analfabetos, deficientes físicos, crianças e idosos como sempre fizeram os
políticos que nos governam. Mais do que nunca, é preciso repetir: não são eles que
apresentarão soluções para as nossas vidas, e sim, nós é que seremos os autores
principais das transformações humanas. O povo cura o povo.
O discurso científico
dos tecnocratas e a falácia dos corruptos desconhecem a força popular. Até
hoje, o que se viu foram manifestações invadirem as ruas contaminadas por
interesses vis e posturas violentas. Noutro texto, disse eu que modifica-se o sistema, mas as pessoas
permanecem as mesmas, então, nada mudará. O grande salto, para o progresso
do Brasil, está na simplicidade das relações sociais. O político faz longos
pronunciamentos, viagens diplomáticas, monta equipes especializadas para conter
a inflação... Tudo muito elaborado, e ineficaz. A população continua morrendo
por ausência de médicos e remédios. Falta aos brasileiros o entendimento da
mais alta tecnologia: o comportamento que conduz ao bem comum e prega o cuidado
reverente à vida.
A dissensão entre
pobres, as inimizades, as vinganças e a criminalidade que coopta soldados nas famílias carentes só
interessam aos políticos e magnatas que bancam as campanhas eleitorais. O
favelado como algoz do favelado é algo surreal. Perde-se a idéia do verdadeiro
vilão. A bala perdida, o comércio fechado por ordem clandestina, o adiamento de
aulas e o pânico atingem o vizinho ao lado. Presidente, prefeitos e
governadores andam de helicóptero; quando em terra, têm a segurança especial de
carros blindados e moram em mansões bem afastadas das áreas de conflito. Se a
miséria nasce da corrupção, por que corromper-se e aumentá-la?
O cidadão periférico,
dentro da economia, deve almejar uma mesa farta, lazer e bons serviços
públicos; no entanto, apenas isso não basta para vencer a crueldade das
políticas de estado. O desejo é energia que oscila, ora fraca, às vezes, forte.
E a ascensão na pirâmide social, puramente, através do dinheiro, seleciona os
seus privilegiados. A maioria fica de fora, e quando experimenta um cenário de
bonança, logo, despede-se dele, engolida pelo humor do mercado. O povo tem que ser bom para o povo, criar a
cultura da solidariedade e cuidar do outro com o mesmo zelo que dedica a um
filho.
Se ficarmos esperando
leis milagrosas que renovem o Brasil, ficaremos cansados, aliás, como já estamos.
A História já ensinou ao homem a fazer revoluções com as armas do holocausto. É
preciso, porém, escrever novos capítulos, sem dores. Se tudo funcionasse bem no
País, o povo não teria de onde haurir forças para se indignar. As grandes
transformações nascem das misérias, onde falta o pão deve haver luta; não
aquela, viciada em combates sangrentos, mas a do imperativo fundamental: o
amor.
Muitos
podem classificar como utópica a proposta, porque descrêem nas potencialidades
humanas. O fracasso da civilização que tem 13 milhões de pessoas suportando a
fome advém da perda do ideal maior. Os políticos pregam a política da razão; ou
melhor, a do falso racionalismo, cheio de números ilusórios; o povo, em
contrapartida, deve se agarrar a política do sentimento. Saber que as crianças
vão morrer de inanição no nordeste, em virtude da falta de comida e água, toda
autoridade sabe, o problema é: quem sente na própria pele a dor do outro?
Seria
esplendoroso se o homem investigasse a sua natureza emocional, há um déficit
considerável nessa área nervosa. Nenhuma máquina por maior que seja a tecnologia
empregada nela, pode ser mais moderna do que o sonho de se harmonizar o
convívio das criaturas. Dirão alguns que defendo um mundo romântico, porém replico:
não! Em verdade, almejo o reencontro
das múltiplas humanidades que habitam o Brasil, cada qual auxiliando a outra
com aquilo que tem de melhor. No mais, entre o romantismo e a destruição a
escolha dever ser óbvia. Os políticos brasileiros não dão importância às chagas
sociais, pois instintivamente confiam na renovação natural que equilibra as
taxas de natalidade e mortalidade. Se a capacidade de procriação hominal parece
infinita, o mesmo não se pode dizer dos ecossistemas. O ser inconsciente
destrói a si e também o seu habitat.
O
pensamento dominante – que prioriza a figura do eu - tem condições de melhorar a vida social num contexto amplo?
Por favor, respondam. Creio ser a democracia o melhor dos caminhos; entretanto,
somente uma filosofia criativa e de mútua cooperação será capaz de fazer
triunfar os direitos legítimos de quem sobrevive. O cidadão não deve enxergar o
universo inteiro para adquirir esse capital inestimável. Basta ao reformador a
sua própria vida, e dela que emerge o entusiasmo contagiante, digno de se
curvar e servir ao semelhante nos ínfimos detalhes existenciais. Não são das
epopéias que nascem os humanistas; eles insurgem da simplicidade.
Escrevo
a realidade que presencio enquanto jornalista, observador da sociedade e de
seus nichos. O palácio do planalto e o parlamento fazem o povo sofrer. Os
governadores, as assembléias estaduais, os prefeitos e as câmeras municipais
não fogem à regra. O povo pode não formar nas suas entranhas um Nelson Mandela para eleger. O que vale é
começar. Pensar algo que não se fala. O dialeto
da imprensa, de muitos sociólogos e políticos parece avesso à vida. O
brasileiro tem sede de uma água que ele nem sequer sabe que existe. Sente o
vazio, vê as instituições e os serviços públicos desumanizados e produzem o
vaticínio: “vergonha!” A identificação já foi feita e tragicamente se mantém
atual. Como superá-la?, eis a questão. A consciência do amor é acessível aos
leigos. Uma sociedade mais justa nascerá quando os depressivos receberem
carinho; os famintos, comida; as crianças aprenderem a solidariedade e o
pretenso marginal escutar: “nesta comunidade não. Você está sozinho”.
Essa
renovação dará às massas uma alma essencial, porque a massa age por
automatismo, já a alma não, ela tem noção de ser e pertencer ao mundo. Tal
insurreição terá conseqüências na cúpula do poder, e as urnas mostrarão novos resultados.
O político, de sempre, irá se questionar: “que povo é esse, que não mais pensa,
tão-somente, em si, e cuidadosamente zela pelo próximo?” Sejamos nós mesmos o
exemplo maior.
Nenhum comentário:
Postar um comentário