O comportamento ensandecido do povo na
presença de ídolos, fabricados pelo mercado publicitário, deveria causar
perplexidade aos agentes sociais. As cenas repetidas de jovens desesperadas
clamando por autógrafos e abraços dos jogadores da seleção estampam uma imagem
triste das relações humanas. Desencontradas, as pessoas insistem em cultivar
paixões artificiais e não percebem a obviedade: o craque tocado por rápidos momentos é um ser intangível. Não por ocupar o patamar de uma divindade. Longe
disso; mas pela distância. O fã, aos prantos, jamais saberá quem o alvo da
idolatria realmente é, pois os seus corpos não se encontrarão mais e, quiçá, o
craque se esquecerá daquela criança que viu num dia qualquer. Algo
absolutamente normal. Os “astros” são muito requisitados, e como diz a velha
sentença – “a multidão não tem rosto”. Se os fãs cultuam determinadas
personalidades; as mesmas, em contrapartida, homogeneízam a fiel claque e fazem
dela uma massa de gritos, assobios e histeria, capaz de criar verdadeiros
ególatras.
Quem
dera toda a paixão ofertada a uma
casta de celebridades fosse, um pouco, desviada para cuidar do vizinho e do
parente, que vivem ao lado. Em vez de adorarem pôsteres, como um hábito normal,
os adolescentes poderiam se dedicar, com apreço, a cuidar das estruturas
dotadas de vida onde bate um coração. Que visão é essa que enxerga aquele que
mora além do Atlântico sem observar pais e avós dentro de casa? Claro que
não se pode generalizar, sob o risco do excesso; há jovens zelosos e cheios de
amor para com os seus; contudo, a frieza de muitos é inegável e facilmente
constatada pelas obras inumanas que a sociedade exibe. Ou, por acaso, alguém
estará mentindo se disser que os idosos sofrem nas masmorras dos lares e que as
mães perdem noites de sono à espera de seus filhos (ébrios noturnos) e,
comumente, sofrem agressões verbais e físicas dos mesmos já narcotizados?
Vive-se num mundo que adora fotografias. A
maioria deseja exibir a fronte maquiada – a aparência superficial; e as fotos
são pródigas nesta arte de escamotear. Como faz falta o olhar radiográfico, que
percrusta a essência e permite localizar a doença para tratar o doente! O
objetivo não é exibir de forma mesquinha os fantasmas e as contradições do
homem; em verdade, a meta é fazê-lo penetrar a realidade de si mesmo. A projeção
da consciência na vida alheia, como se o outro fosse sempre um bem-aventurado,
enquanto aquele que observa põe-se em patamar inferior, lesa as virtudes
imanentes da alma. Não raro, perambulamos cheios de curativos invisíveis; em vez, de andarmos em destino certo. Dá agonia
ver que as referências da juventude utilizam discursos pasteurizados, poses
forçadas e marcas, que fazem do público-alvo um amontoado de cifras.
Se há uma providência
urgente, é a de ocupar o tempo a serviço de quem está ao alcance da mão, que
afaga, acaricia e remedeia. A época de ser enganado pelos slogans patrióticos
já passou. Jogador nenhum joga, verdadeiramente, pelo povo, como dizem. No fundo, eles atuam por ambições, sonhos e
desejos próprios. Os louros de campeão do mundo não enfeitam a cabeça da grande
maioria; para ela, o título só traz a emoção de instantes fugidios. “Quem entra
para história” são os sujeitos da fama, frutos de uma geração paparazzi.
Se tiver que correr, vá
em direção a quem lhe ama, e não, atrás de um ônibus lotado de jogadores que
não lhe conhecem; se tiver que lotar um local de trabalho, preencha as salas de
aula, os professores têm para oferecer lições muito mais importantes do que as de um
treino de bola; se tiver que chorar, chore pela dor de alguém que sofre ao
lado; se tiver que ser brasileiro, seja cuidando de tudo aquilo que vive ao
alcance das suas mãos; enfim... Grite e consagre quem está contigo. Observe os
heróis anônimos.
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