quinta-feira, 12 de março de 2015

Luz: a bagagem espiritual que a alma revela

   Choramingando, Amanda foi pedir “bênção” ao vovô que estava no toco. Com a toalha do pescoço, ele enxugou, delicadamente, as marcas do dolorido pranto. A menina, ajoelhada, abraçou a notável entidade e deixou transparecer a enorme mágoa, acumulada no coração. Antes de qualquer palavra, o Velho utilizou a fumaça perfumada do seu cachimbo como valiosa terapia magística, para acalmar os nervos à flor da pele.

  Após o passe, a voz – que era trêmula – ganhou certa firmeza e deu vida as primeiras palavras:
 – Vovô, um irmão do terreiro me ofendeu, e a pedrada foi tão brusca que parece ter aberto, em mim, uma ferida de morte. Ele espalhou mentiras a meu respeito e, neste momento, todos olham, em minha direção, com desconfiança.

– Filha, disse o Velho. – O ato de julgar é cometido por Espíritos muito infelizes. Sufocados pelos próprios melindres, eles atacam a fim de manter os desavisados do caminho no mesmo patamar que o deles. Se você quiser, achará mil razões para o revide. Mas, a partir do momento que reconhece a divindade de um Mestre, o pupilo deve acompanhá-lo. Entre a sua visão limitada e a de Oxalá, fique com a segunda, pois: com a medida que medirdes, vos medirão também”.  

Para melhor exemplificar a lição, o Pai Velho estalou os dedos sobre a cabeça da médium e lhe recomendou:

  – Olhe, apontando para dois irmãos do terreiro, devidamente, vestidos de branco. – O que você vê?
  Amanda descreveu fisicamente as pessoas. O Preto-Velho repetiu o gesto de sua mironga e reforçou o pedido. Quando a menina observou, novamente, os dois companheiros, não soube explicar exatamente o que via. Em verdade, deixara de enxergar, apenas, o corpo material, ornamentado com belas contas e roupas impecáveis na higiene.

     Bondoso, vovô organizou-lhe as idéias:

    – Agora, você também enxerga através dos olhos da alma. Com permissão do Alto, ativei a vidência, peculiar a sua mediunidade.

 Feito o devido esclarecimento, Amanda descreveu, no que pôde, aspectos da aura de seus irmãos.

 – Vejo, na testa do primeiro, um ponto de belíssima luz; e ao redor do outro, noto algumas sombras.

– Qual a posição que esses dois homens ocupam na Casa?, perquiriu a entidade.

Pelo que sei o primeiro está aqui há anos e participa da maioria dos trabalhos, e o segundo chegou faz pouco tempo.

– Isso, minha filha - sintetizou o Guia, - comprova que há diferentes graus de espiritualidade. A sombra e a luz demonstram o estágio de cada Espírito observado. O religioso não deve acumular horas dentro dos centros, como se a Umbanda fosse um curso que oferece diploma. Às vezes, a presença é enorme, e o aprendizado, minúsculo.  Acredita em Deus, pois nenhum homem, na Terra, pode frear a sua escalada divina. O irmão que lhe calunia também carrega muita escuridão. Mesmo a distância, cuide das feridas dele e siga o trajeto do vôo que você tem direito. Para alma doente, acostumada a ferir, não existe nada superior do que o curativo de uma vítima.

 
 
    




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